quinta-feira, 17 de fevereiro de 2005

"Ser feliz custa p'ra caraças!
Não acho nada. Conversa fiada de quem lhe corre bem a vida, dirão vocês. Nem tanto, desenganem-se. Na verdade, correm-me partes da vida, outras andam, e as últimas mexem-se para trás tal qual caranguejo. Como na maioria da nossa existência, parece-me. Ser feliz ás vezes custa. Custa respirar, doem-nos até partes do corpo que não temos, o coração ameaça parar a qualquer instante. Por falta de força ou de vontade, pouco importa. Mas isso são momentos, dias... semanas, talvez. Alturas em que as lágrimas nos caem soltas com pleno direito, aconchegando o merecido luto de um sonho que morreu. As lágrimas servem para nos lavar a alma, não para afogá-la. Quando saem, vão-nos levando as nódoas interiores, tal qual presto cheio de glutões. Depois do esfreganço, a alma, como qualquer par de meias, tem de ser posta ao ar, para que seque, para que respire, para que deixe o encarquilhado da água e renasça. Para que a possamos vestir de novo, com alegria e confiança. Em Portugal, ser feliz é quase uma afronta. Olham-nos com desprezo por baixo do ombro e sussurram - vai trabalhar porco! É-se julgado anti-patriota, sem amor ao fado, à saudade, às ruelas estreitas do bairro alto. A melancolia está-nos na massa do sangue, a indiferença no olhar e o sofrimento na maneira como balbuciamos - bom dia - quase a medo. Andamos para aqui todos, de borrifador em punho, empenhados em ir mantendo a alma com uma humidade q.b. Nem alegre nem triste, nem viva nem morta, numa canseira infernal!Porque, afinal, ser feliz não custa nada! Existem vidas mais fáceis que outras, mas não existe nenhuma feita só de coisas boas. Tal como não existe, certamente, alguma em que nada se aproveite. Ser feliz, afinal, é agarrar aquilo que nos faz sorrir com unhas e dentes, alterar o que nos mísera a vida e atirar para trás das costas aquilo de inalterável que cada existência acarreta. É fazer das fraquezas forças, já que tudo se transforma e nada se perde.Ser feliz, no fim de contas, custa tanto ou menos que o contrário e traz muito mais vantagens. Porque ás vezes, a tristeza não vem de fora, mas do cansaço interior de complicar tanto, tanto, tanto... a vida!"

Sem comentários: